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Longe do Paraíso (2020)

        Terra, justiça, trabalho e família são as tônicas centrais do filme “Longe do Paraíso” do diretor baiano Orlando Senna. Uma obra forte com tom novelesco e belos enquadramentos. O diretor consegue produzir a conexão com o drama existencial e o social, em uma estética que flerta com o cangaço e o faroeste, atravessando afetos e emoções. Mas, sobremaneira, denunciando a questão fundiária no Brasil. Um tema embebido em luta e sangue do povo que resiste ao poder econômico. É, sem dúvida, um filme denúncia.

 

        O diretor Orlando Senna é emblemático na estética emocional que imprime no filme, entre a questão da posse da terra e da posse do senso de coletividade. Da terra como bem comum, do que nos define como humanos. Fatalmente é o drama da existência exposto na tela de cinema. Haverá paradeiro para essa profusão de questões? A resposta para essa pergunta, e para quão longe estamos do paraíso, o diretor reserva para o final. É preciso chegar lá para saber.

 

        Senna é um ícone da cultura brasileira. Além de cineasta, também é escritor, jornalista, roteirista e um dos mais importantes teóricos sobre o cinema baiano. Roteirizou e dirigiu mais de trinta obras, entre cinema documental e ficção, sem contar a sua produção literária, teatral, jornalística e intelectual. Notadamente uma mente inquieta que está também entre o pensar e o fazer cinematográfico. Está intimamente ligado ao Cinema Novo, ao Cinema Marginal e à Tropicália. Entre os seus principais trabalhos destaco “Iracema – Uma Transa Amazônica” (1975), “Diamante Bruto” (1977) e “A Ópera do Malandro” (1986), na qual ele assina o roteiro.

 

        Segundo o Jornal Correio Braziliense , “Longe do Paraíso” é a primeira ficção pura de Orlando Senna, no qual ele explora o gênero em sua plenitude. Importante também  destacar o elenco do longa-metragem, com representações que por vezes são síncronas e outras assíncronas, como a própria história, o que talvez desconcerte a audiência. Mas que, ao mesmo tempo, confere uma atmosfera muito interessante entre as personagens. É provocativo. O elenco conta com nomes importantes como Emanuelle Araújo, Heraldo de Deus, Ícaro Bittencourt, Sonia Dias e Aline Brunne.


        Kim e Bel! É irrefutável a analogia dos protagonistas com Caim e Abel. O próprio diretor aponta essa inspiração, o que confere ao filme mais uma dimensão: a espiritual. Essa tensão está posta na narrativa. Ele, um matador de aluguel. Ela, uma mulher na luta pela terra e o direito à vida. É na curva do rio do tempo, onde tudo acontece, que esses irmãos terão de fazer escolhas.

*Adriano Denovac – Crítico de cinema da Borboletas Filmes, doutor em História doTempo Presente (UDESC), com pesquisa voltada para o Cinema Negro.